É difícil, precisamos admitir. Às vezes, parece impossível. Mas as palavras “trancar o curso” e “adiar o sonho” não precisam ser as únicas a combinar com sua vida de mãe ou gestante. É possível, sim, conciliar estudo e maternidade e estudar após ter filhos. Isso não depende, claro, só do esforço individual de cada uma. Às vezes sobra força de vontade, mas falta rede de apoio, creche, dinheiro… “O puerpério já é um momento difícil naturalmente. Quando uma mulher não encontra suporte e não se sente minimamente amparada, a possibilidade de ela desistir dos estudos é consideravelmente grande”, comenta Mariana Silva, que criou o grupo Mães Estudantes nas redes sociais.

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Assim como o Mães Estudantes, há outros grupos e páginas no Facebook, a exemplo do Mães na Universidade, e iniciativas que tentam ajudar as mães na difícil tarefa de existirem enquanto estudantes e conciliar maternidade e estudo.

O Observatório Cajuína, por exemplo, entra em contato com organizadores de simpósios, congressos e outros eventos para questionar a infraestrutura ou possibilidade de as participantes levarem suas crianças (sempre que uma estudante entra em contato com as dirigentes pedindo ajuda).

Motivos para não desistir

“Muitas vezes estudei trancada no quarto com minha filha chorando na porta e falando: ‘Quero mamãe!’. Mas eu tinha que terminar pra dar atenção a ela e porque seria bom para nós duas. É cruel, mas também é necessário, não podemos deixar de vivenciar nossos sonhos. É mais difícil, mas dá para viver os dois sonhos”, comenta Vanessa Clemente Cardoso, administradora da página Mães na Universidade e dos grupos fechados Mamães na Pós-Graduação e Coletivo Nacional de Mães Universitárias (todos no Facebook).

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Mas há soluções para tentar driblar alguns obstáculos. Não abandonar o sonho certamente trará resultados positivos, por mais que você tenha de viver um período conturbado e de muita dedicação ao conciliar maternidade e estudo. Ainda mais quando se sabe que, na média, metade das mães fica desempregada até 24 meses após o nascimento do bebê. O número é maior ainda entre as que têm menos escolaridade.

Estudar é uma forma de se aperfeiçoar para enfrentar com mais competitividade o mercado de trabalho e brigar por vagas mais bem remuneradas ou de entrar para o serviço público.

Se este é seu plano, confira as dicas de BabyHome para facilitar esse processo de conciliar estudo e maternidade e vá em frente.

O que levar em conta antes de se matricular ou continuar o curso?

Rede de apoio:

Você vai precisar de uma rede de apoio ou alguma ajuda, principalmente após o bebê nascer. Se não puder contar com o pai na divisão de cuidados, converse com sua família para saber se ela pode cuidar de seu filho quando precisar estudar. Ou, se tiver condições financeiras, analise um berçário ou uma babá. Optar por um curso à distância reduz a dependência dessas redes.

Data prevista do parto:

Se engravidou no meio do curso de graduação ou pós, veja se a data prevista do parto é próxima do fim de semestre ou de ano letivo. Nesses casos, é mais fácil acompanhar o curso sem perder tantas aulas. Quando o nascimento cai no início de semestre letivo, é mais provável que você tenha que trancar por um período o estudo, por ser mais difícil de conciliar com a maternidade.

Tempo que falta:

Se falta pouco para terminar, vale a pena fazer o esforço. Depois de uma longa pausa, é muito mais complicado retomar.

Idade do bebê:

Se o seu filho já nasceu e você quer começar uma graduação, pós ou estudar para um concurso, o melhor é esperar os primeiros seis meses do bebê para se matricular. Além de estar muito disponível para o aleitamento exclusivo, esse período serve para você conhecer seu filho, criar uma nova rotina e passar por essa fase de cuidados mais intensos e cansaço extremo.

Orçamento familiar:

As despesas com uma criança em casa vão aumentar. É preciso analisar esses gastos para saber se o orçamento familiar comporta uma formação particular. Uma solução é optar por um curso à distância, que costuma ser mais barato do que o presencial, uma vez que não exige grande estrutura física de uma instituição para as aulas nem tem limite de alunos por turma.

Dificuldade do curso:

Verifique a complexidade do curso: se você consegue acompanhar com leituras em casa, ótimo. Se ele for composto de vídeo-aulas, melhor ainda. Se o conhecimento é complexo para aprender à distância ou o curso requer aulas práticas, talvez seja melhor fazer uma breve pausa.

Dicas para facilitar a vida e conciliar maternidade e estudo

1) Analise um curso à distância ou semipresencial

Considere fazer um curso de educação à distância (EAD) ou semipresencial, que tem mais encontros obrigatórios que o primeiro, mas muito menos que um curso presencial. Além da mensalidade mais barata, ele traz uma comodidade grande e que faz diferença na rotina com um filho pequeno: o de não precisar sair de casa, requerer menos ajuda da rede de apoio e estudar em horários mais flexíveis.

Para quem não tem o filho em uma creche ou conta com a ajuda de familiares ou profissionais para ficar com ele, o EAD permite que você encaixe a rotina de aulas com as sonecas do seu filho. Dá para estudar e ver os vídeos das aulas inclusive ao amamentar, que costuma demandar bastante tempo nos primeiros meses.

“EAD, vídeo-aula e eventos acessíveis online ajudam muito, mas também precisamos nos organizar para que essa mãe saia de casa com seu bebê. A ideia é inclui-la onde ela quiser e precisar. Muitas vezes nos desdobramos para arranjar uma forma de deixar nossos filhos com alguém e acabamos os escondendo do mundo. Mundo que nos cobra como se não tivéssemos filhos”, diz Claudia Oshiro, do Cajuína.

2) Negocie abonos de faltas e verifique seus direitos

Se você já analisou sua rede de apoio e seu orçamento, viu que falta pouco para terminar ou não vai perder tantas aulas, não precisa trancar o semestre e muito menos abandonar o curso. É claro que a gravidez traz desconfortos e uma rotina de consultas – vez ou outra, você terá de faltar às aulas. E o nascimento implica em dedicação intensa ao bebê.

Mas as legislações brasileira e americana preveem licença para estudantes e você pode tentar negociar com a direção ou diretamente com o professor os abonos das faltas. Há professores que fazem isso mediante a entrega de trabalhos acadêmicos. Informe-se também sobre os auxílios que a universidade oferece. Algumas têm sala de amamentação e creche.

3) Adiante provas e trabalhos

Se puder, adiante as matérias durante a gravidez e combine com os educadores se é possível antecipar provas e trabalhos. Alguns cursos exigem estágio ou aulas presenciais em laboratório e esses você vai ter de deixar para depois. Mas não se sobrecarregue, já que isso não pode ser um fator de estresse.

4) Aproveite as facilidades da tecnologia

Caso sua faculdade tenha aulas online, inscreva-se nelas! Isso evita que você tenha de se deslocar mesmo na gravidez e possa acompanhar a matéria em seu próprio ritmo, em um horário em que esteja se sentindo melhor. Principalmente no fim da gestação, quando a barriga pesa bastante e há situações em que o obstetra pode pedir repouso à gestante – ou quando o bebê ainda é pequeno e demanda mais cuidados.

Se precisar faltar às aulas presenciais, abuse das facilidades da vida moderna. Caso a universidade não disponibilize o conteúdo das aulas em uma intranet, peça para seus colegas gravarem, mandarem fotos de anotações ou da apresentação em power point realizada pelo professor. Criar um grupo no Whatsapp ou organizar uma rede de e-mails sempre ajuda.

5) Negocie a ida do bebê

Converse com o corpo docente sobre a possibilidade de levar o bebê para a sala – contanto, claro, que ele tenha tomado as principais vacinas e seja liberado pelo pediatra. Mesmo no ambiente universitário, o olhar para as mães tem ganhado mais empatia e, volta e meia, professores são flagrados segurando os filhos das alunas para que elas não percam o ano. Essa compreensão é importante inclusive para quando precisar adiar prazos por motivo de doença do seu filho.

Se você se sentir julgada, dialogue com a turma, o corpo docente ou a diretoria. Não permitir crianças é afastar a mulher do mundo acadêmico e científico. Nos Estados Unidos, a lei protege contra a discriminação motivada por gravidez ou parentalidade.

E não se sinta culpada

“Tinha de pedir com vergonha a cada professor para levar meu bebê para dentro da sala e tentar assistir à aula. Muitos eram solícitos, outros nem tanto. Não tinha nenhuma diretriz institucional que me apoiasse”, conta Luana Flor, uma das fundadoras do Cajuína, que teve o apoio dos avós da criança e de uma funcionária da sala de fotocópias da faculdade, que acolhia seu filho para ela acompanhar as aulas.

“Lembro de me sentir muito inconveniente por estar em aula e meu filho começar a chorar. Outra vez precisei trocar a fralda e o único lugar possível era o chão do banheiro da faculdade”, comenta Mariana, que mudou de curso várias vezes até se sentir acolhida como mãe, o que incluiu poder levar seus filhos à faculdade sem julgamentos e ser ouvida pelos educadores. “A mãe estudante precisa ser pensada como uma questão pública. Precisamos de creches de qualidade e dentro dos espaços acadêmicos e acolhimento dessa mulher mãe e suas crianças nas instituições de ensino.”

6) Aproveite os intervalos

Não é o ideal, mas muitas mães acabam usando o período noturno, depois que o filho foi para a cama, para fazer leituras e trabalhos acadêmicos e, assim, conseguir conciliar maternidade e estudo. Aproveite todos os momentos que seu bebê dormir. E saiba que você vai precisar ainda mais de disciplina e foco. Faça cronogramas e fichamentos de leitura, com partes grifadas, que poderão facilitar na hora escrita da tese, dissertação ou trabalho de conclusão de curso.

7) Entenda e aceite suas limitações

Não se cobre: você não vai ter mais o mesmo rendimento de quando não tinha tantos afazeres. “Hoje o mais difícil para mim é compreender que eu não vou dar conta de tudo e que está tudo bem”, diz Mariana.

8) Busque apoio físico e virtual entre mães

Procure se apoiar em outras mães estudantes. Busque no seu campus, entre amigas ou conhecidas que seguiram este caminho e participe de grupos de redes sociais. Com as outras mães, você não só vai ter acesso a dicas para passar de forma menos turbulenta por esse período como terá uma rede de suporte, que é muito importante para se espelhar nas vitórias, aplacar a solidão e não desistir. E conte com a ajuda dos coletivos e do Cajuína, por exemplo, para tentar mudanças estruturais e institucionais que diminuam a desigualdade no tratamento à maternidade.

“Muitas vezes, não encontramos com facilidade outras mães em espaços acadêmicos e escolares. Sentir que você não é a única, que outras mulheres também estão tentando conciliar as demandas e enfrentando cansaços, conflitos e dificuldades semelhantes, ressignifica nossa angústia”, diz Mariana, explicando os motivos que a levaram a criar o grupo Mães Estudantes.

Direitos da grávida no ensino superior

No Brasil:

A Lei 6.202, criada em 1975, estabelece que as estudantes podem estudar em casa a partir do oitavo mês de gestação, desde que apresentem um atestado médico. Ela prevê três meses de licença, que pode ser ampliada em caso de pedido de repouso médico, antes ou depois do parto, e garante o direito às provas finais. Em março de 2018, a Câmara dos Deputados aprovou a ampliação dessa licença para seis meses, conforme o projeto apresentado pelo então deputado Jean Wyllys em 2015 – até a conclusão dessa matéria, ela esperava por apreciação do Senado.

Sendo três ou seis meses, saiba que, se a universidade for particular, você continuará pagando as mensalidades durante a licença, a não ser que tranque o semestre. Se a faculdade não cumprir com o que diz a lei – não abonar as faltas, ou impedir o acesso às provas, por exemplo –, a aluna pode reclamar diretamente nos órgãos de defesa do consumidor. No caso de estágios ou aulas práticas em laboratório, é preciso cumprir a carga horária presencialmente. A legislação, infelizmente, não contempla afastamento para os pais.

Nos Estados Unidos:

A Title IX é uma lei federal de 1972 que protege os estudantes contra a discriminação sexual – isso inclui proteção por conta da condição de gestante ou de maternidade. No caso das alunas grávidas e em recuperação no pós-parto, ela garante o direito a licenças médicas e afastamento em caso de gravidez de risco, mesmo que o período seja maior do que a política da instituição permita.

Ela também determina que a universidade ofereça as mesmas condições que oferta a alunos em situações especiais, como em casos de doença – por exemplo, possibilitar que faça trabalhos em casa quando faltar às aulas , ter instrução domiciliar e a oportunidade de compensar os créditos. A instituição pode oferecer aulas especiais para grávidas, mas a mulher pode recusar se quiser. A lei também exige que as acomodações e serviços sejam adaptados ou facilitados para a gestante, como destinar um assento perto da porta, para as diversas idas ao banheiro, permitir um tempo maior para a realização de exames, conceder uma mesa mais larga e condições para que a aluna possa ficar mais sentada que em pé nos laboratórios.

E mais:

+ A importância de construir uma rede de apoio

+ Gestação x carreira: concilie sem estresse

+ Sem culpa ao retornar ao trabalho

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